Novo Real Decreto-Lei 4/2020 Já não posso despedir um trabalhador se este não comparecer ao trabalho por motivo de doença?

12/3/20

Novo Real Decreto-Lei 4/2020 Já não posso despedir um trabalhador se este não comparecer ao trabalho por motivo de doença?

Na sequência da publicação, no passado mês de fevereiro, do Real Decreto-Lei 4/2020, de 18 de fevereiro, que revoga a alínea d) do artigo 52º do Estatuto dos Trabalhadores, surgiram muitas questões sobre este assunto. Para as esclarecer, é necessário recordar a história e o que estava regulamentado na nossa legislação laboral.

A alínea d) do artigo 52.º do Estatuto dos Trabalhadores estabelecia que a entidade empregadora podia fazer cessar o contrato de trabalho sempre que o trabalhador tivesse um determinado nível de faltas, intermitentes e localizadas em determinados períodos de referência, ainda que justificadas, tendo em conta as faltas que não pudessem ser contadas para esse efeito, quer por constituírem o exercício legítimo de um direito, quer por derivarem de situações especialmente protegidas.

Assim, de acordo com o disposto no referido artigo, indicava-se que a entidade empregadora poderia despedir objetivamente o trabalhador que atingisse 20% dos dias de trabalho em dois meses consecutivos, desde que o absentismo total nos doze meses anteriores atingisse 5% dos dias de trabalho ou 25% dos dias de trabalho em quatro meses descontínuos, num período de doze meses. A jurisprudência acrescenta que "para efeitos de aplicação das percentagens referidas, devem ser tidos em conta os períodos compreendidos nesses dois ou quatro meses, independentemente do que ocorra em cada mês isoladamente, que conta para o conjunto dos períodos referidos".

No que diz respeito à lista de faltas não computáveis, e de forma a compreender o contexto da situação, devemos sempre remeter para o que está estabelecido em cada instrumento de regulamentação colectiva de trabalho aplicável, uma vez que poderão existir situações excluídas da lista fornecida pelo legislador, e outras faltas adicionais poderão também ser computadas.

Esta lista estabelece as seguintes faltas não computáveis como faltas devidas a: greve legal; tempo despendido no exercício de actividades de patrocínio judiciário; acidentes de trabalho; maternidade, paternidade, risco durante a gravidez, amamentação ou doenças derivadas do parto ou da amamentação; as correspondentes a licença remunerada com aviso prévio e justificação; férias; doença ou acidente de trabalho de baixa por doença com duração superior a 20 dias consecutivos e acordada pelos serviços oficiais de saúde; tratamento médico de doença grave ou oncológica; situação física ou psíquica derivada de violência de género acreditada pelos serviços de assistência social ou pelos serviços de saúde, consoante os casos.

Poderá entender-se que qualquer empresa pode proceder à rescisão unilateral do contrato com o trabalhador, por despedimento objetivo, em caso de baixa médica e em qualquer situação? A resposta é negativa, sendo necessário, naturalmente, cumprir os requisitos estabelecidos na legislação laboral em vigor.

De igual modo, é importante não esquecer que na nossa regulamentação laboral existem mecanismos sancionatórios para evitar todas as faltas injustificadas ao trabalho, de acordo com as disposições da convenção colectiva aplicável, e sempre em função do caso concreto, através de sanções, sendo a máxima delas o despedimento disciplinar.

O Real Decreto-Lei 4/2020, de 18 de fevereiro, estabelece que o despedimento objetivo por ausência de trabalho regulado no artigo 52.d) do Estatuto dos Trabalhadores deu origem a diferentes pronunciamentos, tanto do Tribunal Constitucional como do Tribunal de Justiça da União Europeia, este último estabelecendo "a obrigação de existirem mecanismos destinados a contrastar e avaliar a situação concreta caso a caso, a fim de determinar se a medida é proporcional", estabelecendo uma"correção regulamentar imediata para garantir que a doutrina estabelecida pelo TJUE seja devidamente aplicada em Espanha", procedendo à revogação, a partir de 20 de fevereiro de 2020, deste tipo de despedimento.

Assim, é necessário estabelecer que, embora seja verdade que este tipo de despedimento não pode ser utilizado para faltas ao trabalho, justificadas ou não, continua a existir a possibilidade de aplicar sanções ao trabalhador em caso de faltas injustificadas ao trabalho, através do despedimento disciplinar, Importa ter presente que, em caso de doença do trabalhador, o que é necessário ou importante não é o conhecimento da doença por parte da empresa, mas sim a existência de uma justificação para a ausência por doença, o que a diferenciaria do anterior despedimento objetivo, uma vez que, neste caso, não se trataria de um ato voluntário, mas sim de um ato grave e culposo do trabalhador.

MªPaz Abad (Directora T&L)

Artigo publicado na edição de março do jornal mensal CEHAT