Cláusula de manutenção do emprego nas ERTE: O que devo fazer depois da ERTE?

23/3/21

Cláusula de manutenção do emprego nas ERTE: O que devo fazer depois da ERTE?

Desde a publicação, em 14 de março, do Real Decreto 463/2020, que declara o estado de alarme para a gestão da situação de crise sanitária causada pela COVID-19, foram emitidos vários decretos reais ao longo dos meses, dependendo da evolução da pandemia e da situação em que as empresas se encontravam, As ERTES de força maior foram alargadas, oferecendo a possibilidade de isenção de contribuições em função de determinadas percentagens, do número de trabalhadores e do CNAE correspondente das diferentes actividades, com o objetivo de "salvaguardar" uma situação que para muitos se está a revelar muito complicada.

Apesar disso, muitas das empresas do sector começam agora a pensar nas opções que têm à sua disposição a partir de maio, caso os ERTES não sejam prolongados e tenham de reintegrar todos os seus trabalhadores, ou na forma como o verão afectará as vendas e as reservas e se conseguirão fazer face a todos os custos com o pessoal.

Por conseguinte, o mais importante é saber o que dizem os regulamentos em vigor para tomar a decisão certa de uma forma ou de outra.

É necessário destacar um dos pontos mais importantes e mais debatidos, que é a questão da manutenção do emprego. O Real Decreto-Lei 8/2020, de 17 de março, sobre medidas extraordinárias urgentes para fazer face ao impacto económico e social da COVID-19, como todos se recordarão, impôs, pela primeira vez, a obrigação de salvaguardar o emprego durante um período de seis meses a partir da data de retoma da atividade para as empresas que tivessem realizado uma ERTE por motivo de força maior devido à COVID-19, desde que beneficiassem da isenção de contribuições para a Segurança Social. O Real Decreto-Lei 24/2020, de 26 de junho, estabeleceu esta medida para as empresas em ERTE ETOP e o Real Decreto-Lei 30/2020, de 29 de setembro, manteve-a para as empresas que beneficiam de isenções de contribuições para a segurança social a partir de 1 de outubro de 2020. Finalmente, o Real Decreto-Lei 2/2021, de 26 de janeiro, sobre o reforço e consolidação das medidas sociais em defesa do emprego, manteve, como os anteriores, a validade dos compromissos de manutenção do emprego das empresas que beneficiaram de isenções de contribuições para a segurança social para as ERTES aplicadas até 31 de janeiro de 2021, Regulamentou ainda uma nova obrigação de manutenção do emprego por mais 6 meses para as empresas que apliquem as isenções das ERTES de 1 de fevereiro a 31 de maio de 2021, quer se trate de empresas que prorroguem as suas ERTES ou iniciem uma nova.

E porque é que estas medidas podem afetar o tecido empresarial? Não devemos esquecer que nos diferentes decretos reais que foram publicados, no caso dos benefícios de isenção de contribuições por parte das empresas, foram incorporados novos períodos de manutenção do emprego, que estão intimamente ligados à isenção de contribuições, a fim de assegurar a continuidade dos trabalhadores nas empresas e assim evitar, ou assim tentaram evitar, despedimentos em massa. E isto porque, tanto no RDL 30/2020 como neste último RDL 2/2021, o que o regulamento indica é que as empresas se comprometem a manter o nível de emprego por mais seis meses, uma vez que, se a empresa for afetada por um compromisso de manutenção do emprego adquirido anteriormente, o início deste terá lugar quando o anterior tiver terminado. Assim, poderíamos estar perante um período de 18 meses de manutenção do emprego a que a empresa estaria obrigada.

A este respeito, importa referir que a legislação estabelece que as empresas que não cumpram este compromisso de manutenção do emprego devem reembolsar a totalidade do montante das contribuições isentas, incluindo a sobretaxa correspondente e os juros de mora, salvo as excepções previstas na sexta disposição adicional do Real Decreto-Lei 8/2020, de 17 de março, de que falaremos mais adiante.

Se é verdade que em relação à acumulação de prazos para a manutenção do emprego existe um debate aberto em que muitos a consideram inviável e impossível de realizar, não é menos verdade que a Inspeção do Trabalho e da Segurança Social publicou uma Nota Interna sobre as consequências do incumprimento da "manutenção do emprego" em que estabeleceu o critério do reembolso total. Este critério foi subscrito pela Direção Geral do Trabalho do Ministério, bem como pela Tesouraria Geral da Segurança Social, embora seja verdade que deixa a porta aberta para o contestar em tribunal. E quanto a esta "devolução total", pensamos que deve ser feita uma reflexão: se o espírito do regulamento e o seu principal objetivo é salvaguardar, no futuro, o emprego de todos os trabalhadores que possam ter sido afectados por um plano de lay-off temporário e se o empregador é obrigado a devolver todas as exonerações de todos os seus trabalhadores, não se estará a colocar uma ameaça muito séria à viabilidade das empresas do sector, levando provavelmente ao desaparecimento de milhares de postos de trabalho? A resposta seria provavelmente um rotundo sim, mas até à data não existe jurisprudência sobre a matéria, pelo que o empregador deve agir, analisando e avaliando qualquer tipo de ação de acordo com a situação particular de cada empresa. 

No entanto, é necessário recordar o disposto na Sexta Disposição Adicional do RDL 8/2020, de 17 de março, relativa a medidas extraordinárias urgentes para fazer face ao impacto económico e social da COVID-19, que estabelece que o compromisso de manutenção do emprego não se considera violado nos seguintes casos despedimento disciplinar declarado com justa causa, demissão voluntária do trabalhador, reforma do trabalhador, incapacidade permanente total ou absoluta ou deficiência grave do trabalhador, cessação de contratos de trabalho temporário por caducidade do prazo convencionado no contrato ou por cessação da obra ou serviço e cessação da convocação de pessoas com contrato de trabalho sem termo, quando não se trate de despedimento mas de interrupção do mesmo.

Da mesma forma, e de acordo com o Real Decreto-Lei 18/2020, de 12 de maio, sobre medidas sociais em defesa do emprego, estabelece-se que o compromisso de manutenção do emprego não será aplicável nas empresas em que exista risco de insolvência com base no artigo 5.2 da Lei 22/2003, de 9 de julho, em relação ao artigo 2.4 da referida lei. Neste caso, e face à falta de clareza ou imprecisão da regulamentação, o objetivo prioritário deve ser o de dispor de todos os elementos documentais que credibilizem a situação da empresa, de forma a fazer valer esta exceção, caso a entidade empregadora entenda necessário fazer cessar os contratos dos seus trabalhadores.

Ao longo de todos estes meses e das diferentes acções de formação e aconselhamento que temos vindo a oferecer, na TOURISM & LAW, sempre sublinhámos a necessidade de analisar caso a caso. A solução mais adequada nem sempre é "colocar o nosso bote de flutuação, saltar para o rio e deixar-nos levar pela corrente", porque o que fazemos depois? O nosso objetivo deve ser a continuidade das nossas empresas e, para isso, temos de analisar os prós e os contras de cada passo que damos. Neste momento, não sabemos se o ERTES vai ou não ser finalmente prorrogado e, por isso, temos a obrigação de estudar e avaliar as opções que temos à nossa disposição para tomar a decisão correcta, uma vez que, se o governo, os sindicatos e as entidades patronais não concordarem com a prorrogação, as empresas terão de reintegrar todo o seu pessoal, com todas as consequências que isso implica.

MªPaz Abad (Advogada-Directora T&L)